A Geografia das ações políticas de enfrentamento à COVID- 19 em Mato Grosso: uma análise de março de 2020
Autores
Adeildo Allif da Silva Alves2
Aury Hellen dos Prazeres Mesquita2
Camila Salles de Faria1
Cleberson Ribeiro de Jesuz1
Dennys Alves Freire2
Emerson Inácio da Silva2
Franciellen de Almeida Figueiredo2
Gláucia Oliveira da Silva1
João Lucas Buzatto2
Marcos Vinicius Duarte da Silva2
Odaiza dos Santos Alvarenga2
Salomon Morales Cano Jimenez2
Silas Francisco dos Santos Lima2
Sílvia Fernanda Cantóia2
Vandinei Santana da da Silva2
Verbena Florencia de Sousa2
2 Discente
Contextualização da problemática
Figura 2: Fluxograma das atividades desenvolvidas na avaliação das ações municipais em Mato Grosso.
1. Interstício de 16 a 31 de Março de 2020: a dinamicidade das ações políticas e sua espacialização em Mato Grosso
Desse modo, entre os 141 municípios mato-grossenses 4,9% editaram medidas somente na primeira semana do interstício, e outros 11,3% editaram na segunda parcela, e os 118 municípios restantes apresentaram edições e ações nas duas semanas (Fig. 3).
1.1 Primeiras medidas e o primeiro caso confirmado: semana de 16 a 22 de março
1.2 Aumento do número das ações políticas municipais e de casos confirmados da COVID-19 em Mato Grosso: período de 23 a 31 de março de 2020
[...] Devemos sim voltar à normalidade. Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, a proibição de transportes, o fechamento do comércio e o confinamento em massa. O que se passa no mundo é que o grupo de risco é de pessoas acima de 60 anos. Então, por que fechar escolas? [..] (UOL, 2020).
Na preponderância entre o interesse econômico e o interesse à saúde em geral, deve prevalecer o segundo. A vida é o bem maior do ser humano e a condição para ser tratado com dignidade [CF, art. 1º, II] (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MATO GROSSO, 2020, p. 17).
2. Ação política: criação de comitês e/ou gabinetes de controle de crise
O entendimento majoritário dos municípios mato-grossenses foi seguir a égide federal e estadual de criação de Comitês e/ou Gabinetes de controle de Crise, Campanhas Publicitárias e Orientativas de Ações em consonância com o avanço da COVID-19. Desse modo, o entendimento de crise, deve ser entendido pelo viés que Da Silva (2016, p. 92) nos aponta,
[...] esse conceito definido pelo dicionário de língua geral como “grave desequilíbrio conjuntural entre a produção e o consumo, acarretando aviltamento dos preços e/ou da moeda, onda de falências, desemprego, etc.” [...]
Portanto, a compreensão geral das ações dispensadas pelos municípios no estado de Mato Grosso, sumariamente prestigiaram a concepção econômica da pandemia global da COVID-19, no que tange a designação de criação dos referidos comitês para interesses primordialmente econômicos, seguindo a luz do governo federal, por meio da escolha inteiramente política dos principais agentes que formam essa coalizão, endurecida no âmbito das secretarias e do núcleo político municipal.
A lógica por trás da promulgação desses comitês a fim de montar estratégias para salvar ou resguardar o setor econômico em detrimento das ações de saúde e adoecimento da população, vem sendo fortemente debatido em muitos âmbitos, e em sua grande maioria, o consenso daquelas que privilegiam o mercado, não surtem efeitos, pois o capital humano adoece, vivencia o medo, e consequentemente diminui o consumo, essa posição é vista na fala de 75 pesquisadores economistas da UFRJ, em carta aberta, dirigida a sociedade, onde debatem que,
[...] as medidas implementadas de isolamento e/ou quarentena para impedir o avanço do vírus nos países mais afetados provocaram a interrupção das atividades normais das pessoas, desmobilizando recursos. Isso impactou negativamente a produção, o consumo corrente e os investimentos. Portanto, a gravidade dos efeitos econômicos da COVID-19 deve-se à sua capacidade de gerar, ao mesmo tempo, choques negativos na oferta e na demanda agregada mundial. Ademais, há uma enorme pressão sobre os recursos (físicos e humanos) na área de saúde com o aumento dos casos de pessoas infectadas, sobretudo no pico da epidemia, o que requer uma espécie de economia de guerra nesse segmento (CARTA ABERTA - ECONOMIA DA UFRJ, 2020).
Cabe ressaltar, que há exceções de alguns municípios, que em primeiro momento seguiram essa lógica, entretanto, possibilitaram edições suplementares que vieram a incluir agentes da sociedade civil e organizações de modo ampliar a conjuntura de possibilidades de interlocutores no trato da crise de saúde mundial.
A proporcionalidade dos municípios que no recorte temporal analisado (16 a 31 de março de 2020) que não promoveram nenhuma ação de criação de comitês, gabinetes ou ações publicitárias, orientativas foi de 13,4%, enquanto municípios que promoveram duas ou mais ações somam 58,4% dos 141. A espacialização dessas ações por área municipal pode ser vista na Figura 4.
Figura 4: Mapa de espacialização dos municípios que constituíram comitês e gabinetes de crise no interstício de 16 a 31 de março de 2020.
O que observa mais atentamente na referida espacialização são municípios que não apresentaram nenhuma ação quanto a criação de comitês e/ou gabinetes de crise estão dispostos nos vales do rio Cuiabá (Pantanal Setentrional) e no Vale do Rio Araguaia, em setor de médio/baixo curso.
3. Ação política: declaração de estado de calamidade pública e emergência de saúde pública
[...] Art. 65. Na ocorrência de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembléias Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação:
I - serão suspensas a contagem dos prazos e as disposições estabelecidas nos arts. 23 , 31 e 70;
II - serão dispensados o atingimento dos resultados fiscais e a limitação de empenho prevista no art. 9º.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput no caso de estado de defesa ou de sítio, decretado na forma da Constituição (BRASIL, 2000).
Figura 5: Decretos de Situação de Emergência e Calamidade Pública dos Municípios do estado Mato Grosso no Mês de Março/2020.
Figura 6: Espacialização dos municípios que decretaram situação de emergência no dia 24 de março de 2020.
4. Ação política: fechamento do comércio e de outros serviços não essenciais
A feira, em muitos municípios do Mato Grosso, configura-se como um espaço de resistência camponesa. Como, no Vale do Araguaia, por exemplo,
[...] Mais do que isso, a feira é um espaço de expressão do campesinato, como afirma Cláudia Araújo, da CPT. ‘Este espaço é fundamental para a reprodução dos camponeses, pois é onde o campesinato se expressa, dialoga, se relaciona, interfere. Não existe apenas uma relação de mercado, mas um espaço de vivências, de troca de experiências, lazer para garotada, lugar de contar causos, mostrar o que a terra produz e que o núcleo urbano perceba e respeite o papel que o campesinato desempenha na sociedade (RIBEIRO, 2015).
5. Ação política: aquisição de materiais e equipamentos sem licitação
Tabela 1: Visualização das áreas regionais de Mato Grosso e seus respectivos municípios.
O panorama de distribuição de ventiladores mecânicos por regional conflita com a disposição de habitantes residentes nas mesmas, onde a porcentagem de equipamentos por pessoa é na média 1.51%, sendo que, nas regionais de maior concentração humana esses valores são bem menores, ou como é o caso da Regional de São Félix do Araguaia é zerado, conforme a Tabela 2.
Esse panorama de regionais e disponibilização de equipamentos por municípios levou a muitos deles a promulgar ações de compra e formas de adquirir respiradores automáticos e infraestrutura mínima temendo o avanço do novo coronavírus em seus territórios. Assim, é possível verificar na Figura 10, que grande parte dos equipamentos concentram-se nas cidades de maior índice populacional (Cuiabá, Várzea Grande, Rondonópolis, Sinop, Sorriso, Cáceres, Barra do Garças, Tangará da Serra), e muitos desse municípios temendo o crescimento vertiginoso abriram demandas por meio das ações políticas para compra de novos equipamentos.
Figura 10: Espacialização dos municípios com ações de compra e aquisição de equipamentos hospitalares para o combate a COVID-19 em Mato Grosso.
6. Ação política: suspensão de atividades escolares
Figura 11: Espacialização dos municípios com ações de fechamento de escolas no interstício de 16 a 31 de marco de 2020 em Mato Grosso.
No dia 18/03/2020, dezoito (18) municípios lançam decretos suspendendo as atividades escolares em toda rede, dentre eles, o município de Cuiabá através do decreto nº7846 de 18/03/2020 que aponta,
Fica evidente nestes artigos que as escolas, além de territórios de trocas sejam elas de conhecimento, seja social, também são locais onde os alunos realizam suas refeições diárias, retratando a desigualdade e pobreza econômica vivenciada por inúmeras famílias, faceta esta que fica cada vez mais evidente no isolamento social imposto pela Pandemia.
As desigualdades sociais são cada vez mais acirradas e perversas e são destacadas no mesmo decreto,
O referido decreto aponta também a contradição acerca do estado de Mato Grosso, que lidera a exportação de grãos e se destaca no cenário econômico, porém, enfrenta a questão da fome por parte da parcela dos cidadãos mato-grossenses, retratada e em diversas escolas da capital.
Segundo dados do Portal do Brasil[10] no estado de Mato Grosso, dentre os 141 municípios 161,2 mil famílias são beneficiadas pelo Programa Bolsa Família, e que grande parte do grupo receberá o Auxílio Emergencial do Governo Federal para o enfrentamento à pandemia do coronavírus.
Sobre a Fome,
O nosso saudoso Josué de Castro, precursor entre nós, e mesmo no plano internacional, dos estudos científicos a respeito desse problema trágico da humanidade, e que afeta de modo tão desastroso e doloroso o nosso país, mostrou bem claramente a interdependência entre o problema sanitário da população, cuja fonte é primacialmente de natureza alimentar, e o problema sócio-econômico da estrutura política da nacionalidade. Josué de Castro faz mesmo remontar as causas originais da subalimentação endêmica em nosso país ao início de nossa colonização (CASTRO, 1984, p.16)
Para que haja melhor elucidação da divisão entre público e privado segue na Tabela 4 as matrículas das escolas públicas e privadas segundo o Censo escolar INEP 2018 e o número de alunos correspondentes.
Diante dos números percebe-se que a educação pública ainda é a que mais concentra estudantes, estes, com deficiências que vão além da questão de aprendizagem, uma delas a baixa renda das famílias que dependem do Programa Bolsa Família e refeições oferecidas na escola.
Com a separação generalizada entre o trabalhador e o que ele produz, perde-se todo ponto de vista unitário sobre a atividade realizada, toda comunicação pessoal direta entre os produtores.Seguindo o progresso da acumulação dos produtos separados, e da concentração do processo produtivo, a unidade e a comunicação tornam-se atributo exclusivo da direção do sistema. A vitória do sistema econômico da separação é a proletarização do mundo (DEBORD,1997, p.22)
7. Considerações
Notas
[5] Decisão disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Adi6341.PDF. Acesso em abril de 2020.
8. Referências Bibliográficas
Forma de citação:
ALVES, A. A. S.; MESQUITA, A. H.; FARIA, C. S.; JESUZ, C. R.; FREIRE, D. A.; SILVA, E. I.; FIGUEIREDO, F. A.; SILVA, G. O.; BUZATTO, J. L.; SILVA, M. V. D.; ALVARENGA, O. S.; JIMENEZ, S. M. C.; LIMA, S. F. S.; CANTÓIA, S. F.; SILVA, V. S.; SOUSA, V. F. A Geografia das ações políticas de enfrentamento à COVID- 19 em Mato Grosso: uma análise de março de 2020. Relatório Técnico. IGHD/Departamento de Geografia – UFMT: Cuiabá, 2020.